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sábado, 8 de outubro de 2011

Gafes

As gafes fazem parte da vida. A parte arteira da vida. São simples, ingênuas e verdadeiras. Geralmente surgem nos momentos mais inesperados. Eliminam defesas. Expõe medos, fraquezas e limitações. Na minha imaginação, a história com elas se dá mais ou menos assim. O comando central dispara a ordem: “Atenção! Atenção! Acionar gafe. Favor desprogramar defesas e liberar travas!". Quando isso acontece, cuidado! Muita coisa pode acontecer. No ano passado, minha amiga Alice (nome fictício) resolveu preparar uma surpresa para o marido que estava viajando a trabalho há mais de um mês. Ela soube que ele voltaria para casa na semana anterior à data programada. A secretária descobriu a novidade. O plano inicial era pegá-lo no aeroporto e curtir um jantar em grande estilo. Depois de tanto tempo sem se verem, Alice queria que tudo saísse romanticamente perfeito. Foi então que se lembrou da cena do filme “Uma Linda Mulher”, onde Julia Roberts aguarda Richard Gere no quarto de um hotel vestida com uma gravata masculina. “Bingo!”, pensou Alice. Pensou não. Ela fez. Toda a cena. Com direito a detalhes cinematográficos: taças de champanhe e frutas vermelhas para erotizar ainda mais o ambiente. No dia D, preparou-se cedo e aguardou ansiosa o horário da chegada do amado. Em casa. Sentada na sala. E pelada. Ela com seu perfume. Pensativa. Ansiosa. Feliz. Aguardando a entrada triunfal: Dele. Não demorou muito. Ouviu o carro estacionando na garagem. O mesmo giro da chave na porta. Passos firmes no hall. Finalmente havia chegado. Estava bem ali. Parado. Lindo e charmoso como sempre. Mas havia algo errado. Algo que não conseguiu entender de imediato e que a deixou constrangida. Era o olhar dele. Frio como o gelo que agora balançava dentro da taça trêmula. Aquele olhar congelou sua reação de tal forma que ficou muda e imóvel por uma eternidade. O que teria acontecido? O que teria feito de errado? Exagerara na surpresa? Qual o problema? Teria sido a gravata? O champagne? Mas o que..? Foi então que os gritos trouxeram-na de volta à realidade. “Onde ele está, Alice? Onde se escondeu o canalha? Diga logo!!! Onde ele está???” Foi aí que ela entendeu tudo. Ele também imaginara fazer uma surpresa. Tanto que saiu percorrendo todos os cômodos da casa atrás do "suposto" amante, sem querer escutar as explicações ou dar bola para as lágrimas da esposa. “Não é nada disso que você está pensando”, disse ela. O clichê era a mais pura verdade. Depois de muita briga, histeria e choro resolveram dar um tempo. Foi o suficiente. No mês seguinte estavam separados. Tempos depois, tudo devidamente esclarecido, tiveram a cara de pau de por a culpa nela. Na gafe. Uma simples gafe destruiu sozinha 15 anos de um casamento perfeito. Foi a explicação dada. A única coisa que não conseguiram explicar e nem descobrir até hoje foi se a gafe havia sido dela ou dele...

domingo, 25 de setembro de 2011

Corrupção

O Valor Econômico publicou em 23/09 artigo do professor Alberto Carlos Almeida, autor de "A Cabeça do Brasileiro", sobre reforma política e corrupção. Segundo ele, o problema da corrupção está mais relacionado à nossa fragilidade institucional do que a modelos eleitorais abertos ou fechados. Reflitamos sobre isso. Na condição de profundo conhecedor das idiossincrasias brasileiras, não estaria o professor disposto a provocar uma discussão maior do que aquela que nos aponta em seu artigo? Será que seu objetivo não seria analisar as matizes de nossa cultura? Estaria ele se propondo a debater questões mais complexas e que tem a ver com comportamento, atitude diante dessa ou daquela situação, ou mesmo com a desgastada, porém ainda válida, lei de Gérson? Nas entrelinhas de seu discurso ele esconde a pergunta: somos um povo corrupto? A dúvida gera mal estar e vai na contramão do sentimento ufanista que, por vezes, surge no horizonte verde e amarelo e deixa a realidade mais colorida do que de fato ela é. Somos um povo corrupto? As situações cotidianas são sempre bastante reveladoras. A sensação é de "déjà vu", e a semelhança com a realidade, infelizmente, não é mera coincidência. Dia desses, um síndico (conhecido meu) resolveu contratar serviço de segurança para seu condomínio. Das empresas contactadas, todas, sem exceção, apresentaram orçamentos que, se aprovados, gerariam vantagens "extras" para o síndico e "benefícios" para sua propriedade privada. Tudo sem "nenhum" custo adicional. Sabe aquela historia do almoço grátis? Pois é. Atitude vergonhosa. Por outro lado, dentro de casa, o mesmo síndico que reclamou para mim da tentativa de corrupção por parte dos fornecedores, há mais de cinco anos deixa de recolher os impostos trabalhistas devidos à empregada domestica que contratou para cuidar de sua casa. Enquanto clama por justiça social, o tal sindico e muitas outras famílias negam direitos mínimos a milhares de profissionais que continuam a viver na informalidade. Almeida está certo. É fato que nossas instituições não funcionam como deveriam. Mas também é fato que nós, brasileiros, não funcionamos como deveríamos. Ainda não somos um povo que possa se orgulhar do exercício pleno de sua cidadania. Somos tão bons em pleitear direitos quanto em esquecer de nossos deveres. Talvez nos falte maturidade e auto-crítica suficientes para reconhecer o problema e seguir adiante. No combate à corrupção cada um deve fazer a sua parte. Corrupção não é só coisa da cabeça de político brasileiro. Ela permeia outras cabeças também. Resta saber quantas, de quem são e o que elas pensam. Tema para um novo estudo...

sexta-feira, 2 de setembro de 2011

Excessos


Tudo em excesso faz mal. Ao corpo e à alma. Uma inofensiva castanha, se consumida de forma exagerada, pode causar sérios problemas à saúde. Da mesma forma, o amor desmedido, sem limites, pode fazer ruir a estrutura emocional de quem ama ou é amado. Mas existem excessos que causam outros tipos de danos. É o caso do PODER. Poder demais corrompe. Destrói. Anestesia. Vira ditadura. Poder demais é ilegítimo. Desconhece as leis. Ignora o Direito. Quando vivo, meu pai repetia sempre: “Tina, o seu direito acaba quando começa o direito do outro”. Lição difícil. No trânsito, no trabalho ou em casa. É preciso enxergar para o outro os mesmos direitos que enxergamos para a gente. O oposto disso chama-se excesso. Ou, se preferir, abuso de poder. Inúmeros excessos têm sido cometidos nos últimos anos. Excesso de algemas. Excesso de fotos. Excesso de denúncias. Excesso de prisões. Excesso de calúnias, injúrias e difamações. Ao içar a bandeira da moralidade tudo parece permitido. “O que significa a desonra de um inocente em meio à prisão de mil culpados?” Os fins estão aí para justificar o injustificável. Em nome da educação, crianças são espancadas. Em nome da honra, mulheres são assassinadas. Em nome da causa, propriedades são invadidas. Em nome da notícia, mentiras são divulgadas. Em nome de partidos, leis são desrespeitadas. Em nome de Deus, cidades são destruídas. Em nome da paz, guerras são iniciadas. Em nome da democracia, soberanias são aviltadas. Em nome do desenvolvimento, o planeta é destruído. Enfim, em nome do povo vale qualquer negócio. O problema é que o “em nome de” é, na verdade, um grande blefe, cujo único objetivo é o PODER. "Quanto maior o poder, mais perigoso é o abuso." O autor dessa célebre frase chama-se Edmund Burke. Lembro de outra frase igualmente célebre encontrada no artigo 5º da Constituição Brasileira e que serve de antídoto para o aviso dado pelo filósofo irlandês: “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”. Daí o “princípio da presunção de inocência”. É obrigação do Estado garantir que processos investigativos sejam conduzidos com a menor restrição possível aos direitos individuais, preservando a dignidade e a intimidade da pessoa acusada, assegurando-lhe tratamento compatível com sua condição inicial de inocente. A restrição da liberdade, quando ocorrer, deve estar baseada em fatos e dados concretos. Deve, acima de tudo, preservar os direitos do cidadão, evitando constrangimentos, humilhações ou exposição indevida, especialmente pelos meios de comunicação. Estranho. Tenho a nítida impressão de que no Brasil a práxis é outra. Aqui, “todo mundo é culpado até que prove o contrário”.  Com um agravante: o ônus da prova recai sempre sobre o acusado. Sem exceção. Apenas EXCESSOS...

sábado, 27 de agosto de 2011

Plano x Idéias = Powerpoint

É de dar inveja a capacidade que o gestor público tem de produzir diagnósticos "powerpointnescos". Inveja maior causam as idéias que surgem desse universo informacional. Para todo problema uma solução. Mesmo que inviável. E quase sempre desprovida do velho e bom checklist 5W2H. What? (Ação), Why? (Justificativa), Where (Local), When? (Prazo), Who? (Responsável), How? (Estratégia), How much? (Custo). Tive contato com esta fórmula ainda na universidade quando estudava jornalismo. Foi onde aprendi que até uma breve notícia de jornal necessita de um mínimo de aprofundamento para ser veiculada. Na administração pública o planejamento peca ao dar mais importância para a idéia do que para a ação, o que torna o espaço existente entre as duas maior que o abismo Laurenciano, cuja fossa abissal localizada no Canadá há muito deixou de ser a mais profunda do planeta. Ponto para o Brasil. Aqui, pouco do que se planeja na área governamental vira realidade. Afinal, papel e power point aceitam tudo. Os administradores públicos pegaram a manha dos jogadores de futebol: passaram a jogar para a platéia. A generalização é proposital. A quantidade de iniciativas e ações propostas no serviço público cresce na proporção inversa de seus resultados. Uma das razões é a falta de qualificação profissional. Não basta a realização de concursos públicos para preencher cargos disponíveis no setor. Isso é "default". Necessário dar um passo à frente. Investir na elaboração de planos de carreira e na formulação de políticas que garantam a ascensão profissional com base no mérito (avaliação do desempenho individual) e no esforço pessoal (busca continua por capacitação e reciclagem). Para os casos em que o servidor exerça cargo de direção, o nível de cobrança deve ser ainda maior, exigindo-lhe o compromisso de contribuir para o resultado do conjunto das ações públicas, o que significa enxergar a tal floresta e não apenas um pedacinho do caule do seu ipê. Outras situações precisam ser enfrentadas, a exemplo da histórica dicotomia entre o papel de quem decide (político) e o papel de quem executa (servidor). Diz a prática que o segundo está sempre a serviço do primeiro, o que nos remete à pior concepção de um burocrata: aquele que trabalha para o chefe imediato e não para o Estado. Some-se a isso a inexistência em pleno domínio da tecnologia da informação de um sistema confiável que consiga avaliar o desempenho individual do gestor público. A maioria dos indicadores existentes controla, quando muito, os resultados de unidades ou setores inteiros. Raríssimos são os casos de monitoramento da performance particularizada dos responsáveis pela formulação ou implementação de ações, projetos, programas ou políticas governamentais. Várias reformas administrativas ocorreram sem que o Estado enfrentasse essas distorções. Modernos instrumentos de combate à corrupção foram lançados como panacéia da burocracia do Estado Brasileiro. Mas a realidade mostra que sempre existiu grande incapacidade das autoridades competentes em promoverem uma agenda nacional em prol da qualidade da gestão pública. As inovações administrativas ocorrem por espasmos, oriundas de iniciativas isoladas, sem o necessário eco social. O processo de fortalecimento da democracia participativa, apesar dos avanços, ainda é considerado incipiente. Poucos governos (municipais, estaduais, distritais ou federais) acreditam na eficácia do diálogo permanente com a sociedade como forma de fortalecer, aprimorar e controlar os resultados de ações ou políticas públicas. Um controle social rígido evitaria, por exemplo, que um servidor ocupasse determinado cargo na área pública (durante anos!) sem apresentar nenhum resultado. Aos olhos míopes do Estado o que importa é que aquele burocrata permaneça "ficha limpa". Ou seja, desde que não recaia sobre ele nenhuma ação de improbidade administrativa, o resto é mero detalhe. Com isso, o que era para ser obrigação tornou-se diferencial na carreira pública. Não se enxerga que o custo da ineficiência pode ser maior que o da corrupção. Ambos devem ser combatidos com igual rigor. Não dá para achar que aquilo que era para ser obrigação - honestidade - sirva para premiar servidor medíocre. Não é de se estranhar que mais e mais jovens estejam abdicando de suas vocações e do sonho de uma carreira profissional de sucesso para virarem "concurseiros", estudando diuturnamente com o objetivo de passar em algum concurso público. Qualquer um. De auditor fiscal à funcionário de estatal vale tudo. Se aprovados, imaginam todos, estará garantida uma gorda e cobiçada renda vitalícia. Chova ou faça sol. Com ou sem resultado. A ironia é que cedo ou tarde virá a pergunta: e para que serve mesmo um Estado sem resultado, hein?

C'était un rendez vous!

Fonte: Spam
Em agosto de 1978, portanto há 33 anos, o cineasta francês Claude Lelouch adaptou uma câmera giroscopicamente estabilizada na frente de um Ferrari 275 GTB e convidou um amigo, piloto profissional de Fórmula 1, para fazer um trajeto no coração de Paris, na maior velocidade que ele pudesse. A hora seria logo que o dia clareasse. O filme só dava para 10 minutos e o trajeto seria de Porte Dauphine, através do Louvre até a basílica de SacreCoeur. Lelouch não conseguiu permissão para interditar nenhuma rua no perigoso trajeto a ser percorrido. O piloto completou o circuito em 9 minutos, chegando a 260 km por hora em certos momentos. O filme mostra-o furando sinais vermelhos, quase atropelando pedestres, espantando pombos entrando em ruas de sentido único. O sol nem havia raiado ainda. O piloto, teria sido René Arnoux, ou Jean-Pierre Jarier. Quando mostrou o filme em público pela primeira vez, Claude Lelouch foi preso. Mas ele nunca revelou o nome do piloto de fórmula 1 que pilotou a máquina e o filme foi proibido, passando a circular só no underground. Se você não viu ainda o clássico, prenda a respiração e clique no link do título ou direto no menu à direita de sua tela. Vale a pena curtir a emoção de passear em Paris como se estivesse a bordo de um Ferrari 275 GTB.

quarta-feira, 27 de julho de 2011

Patrocinar é um bom negócio?

Verdade seja escrita. Não é de hoje que empresários dos mais diferentes ramos de atuação discutem sobre a eficácia dos investimentos alocados em ações de comunicação e marketing. Há pelo menos 30 anos já se buscava uma forma de mensurar a relação entre o volume investido em publicidade e o crescimento esperado dos negócios. A expectativa era de que a cada inserção comercial no intervalo da novela das oito corresponderia uma venda de um produto ou serviço anunciante. Impossível? Não. Absurdo? Pode ser. Com o passar do tempo, a celeuma balzaquiana arrefeceu (thanks God). Contribuíram para isso o advento da comunicação digital, o surgimento de sofisticados sistemas de monitoramento e modernas ferramentas de avaliação de resultados, trazendo maior conforto para os CEOs e mais trabalho para as agências de propaganda. No entanto, todo esse aparato tecnológico pouco contribuiu para o entendimento da relevância do patrocínio empresarial do ponto de vista estratégico. Nesse campo ainda impera o ceticismo. É minoria a legião de profissionais que consideram-no, de fato, um bom negócio.
O patrocínio nasceu na publicidade; cresceu no marketing de eventos; especializou-se no segmento esportivo; intensificou-se na área da cultura via leis de incentivo fiscal; diversificou-se no apoio a outros setores; conquistou espaço na era do "CRM" (gestão do relacionamento com clientes); ganhou notoriedade a partir do crescimento da indústria de entretenimento, adquirindo múltiplas funções. Por meio dele foi possível ampliar o escopo da comunicação, consolidando boas práticas de cidadania corporativa e, o mais importante, superando o desafio imposto pela saturação da publicidade convencional. Porém, o crescimento acelerado do patrocínio trouxe consigo vícios que devem ser eliminados. A inexistência de critérios claros para seleção de projetos e a falta de sinergia entre as ações de comunicação e a estratégia empresarial induziram a pulverização excessiva dos investimentos. O patrocínio passou a ser visto como uma espécie de “recurso não-reembolsável”. Ou seja, apoio financeiro sem retorno quantificável. Em casos mais graves: AÇÃO EM 3D: DESPESA, DOAÇÃO E DESPERDÍCIO. Nada mais anacrônico. As ações de patrocínio, em sua maioria, dão resultado. O problema é que esse resultado normalmente não aparece no curto prazo. Mesmo projetos institucionais, que garantem “somente” exposição da marca, são invariavelmente oportunidades de fortalecimento da imagem da empresa, de seus produtos e serviços. Quando bem trabalhados, com ações de ativação, trazem grande retorno a médio e longo prazos. Exemplos: lealdade de clientes, recall de marca, rejuvenescimento da imagem, simpatia dos públicos de interesse, maior inserção da empresa na comunidade, dentre outros. Infelizmente, pirronismo de um lado e falso pragmatismo de outro prevalecem em detrimento dos benefícios oriundos de um processo de planejamento e foco do qual carece o patrocínio empresarial. A muitos executivos falta a necessária energia gerencial para estabelecer objetivos e metas claras, definir o público que se pretende atingir e estabelecer valores e atributos que se deseja ressaltar antes de fixarem o orçamento disponível para cada exercício.
Simples assim? Pergunta o leitor. Não. Responde a blogueira. Para tornar o patrocínio um bom negócio é preciso mais. É preciso também garantir o tripé da democratização (igualdade de oportunidade e acesso do público a bens, produtos e serviços resultantes das ações patrocinadas), transparência (critérios e mecanismos de seleção pública para escolha de projetos), e articulação (construção de redes e ações de mobilização social). E tudo isso acrescido de um ingrediente final. Um segredo da culinária administrativa que sempre confere sabor especial ao prato patrocinado. Além de se caracterizar como diferencial na promoção da marca ou mesmo na venda de produtos, o patrocínio pode, aliás DEVE, gerar valor para a sociedade. O bom uso das ações patrocinadas permite reforçar iniciativas no campo da responsabilidade social. A abordagem corporativa dada pelo triple bottom line * reforça o conceito de sustentabilidade também inserido no contexto das ações de patrocínio. Existe um movimento que revela que as empresas começam a despertar para a necessidade de alinhar essas iniciativas a objetivos corporativos mais amplos. A notícia boa é que a convergência com a esfera social já pode ser constatada hoje, tanto na área pública quanto privada. Editais sintonizados com programas governamentais e com iniciativas da sociedade civil organizada, valorização de projetos com desdobramentos educacionais ou que demonstrem preocupação com a preservação do meio ambiente são exemplos de práticas bem sucedidas. A notícia ruim é que essas iniciativas ainda são exceção.

Minha natureza otimista me obriga a terminar o artigo com uma predição. Empresas que desejam perenizar-se no mercado devem responder aos anseios da sociedade e ir além de seus estatutos. Levado a sério, o patrocínio empresarial pode ser um bom aliado e, por que não dizer, um bom negócio para todos.

(*) Conceito que reúne três pilares da gestão empresarial sobre os quais uma empresa deve sustentar sua estratégia para garantir perpetuidade no mercado: viabilidade econômica, responsabilidade social e proteção ambiental. Alguns autores utilizam também o trinômio profit, people e planet (lucro, pessoas e planeta).

quinta-feira, 7 de julho de 2011

Via Crúcis da Beleza (ou Ingrato Cotidiano Feminino)

Sei que papo "Patricinha" não combina com o estilo pseudointelectual do blog. Mesmo assim vou arriscar a pseudoreputação do coitado. A vontade de desabafar é maior do que o ego da pseudoescritora. Existe algo pior do que salão de beleza no sábado? Cuidar do cabelo, das unhas e demais acessórios do corpo é prá mim uma verdadeira Via Crúcis, com direito a muito mais do que quatorze estações de sofrimento. Sabe aeroporto em época de férias e promoção da Gol a R$ 100 ida e volta para o Rio? É isso. Você nunca sabe o que esperar. Muito menos QUANTO esperar. Em algum lugar do mundo há de existir o salão de beleza ideal. O mesmo dos nossos sonhos. Um lugar onde hora marcada funciona de verdade. Onde você pinta o cabelo e troca a cor do esmalte sem precisar riscar um sábado inteiro do seu tão disputado calendário da vida. Infelizmente a realidade é bem outra. Haja desperdício de tempo. A impressão que dá é que salão de beleza é um empreendimento comercial que nunca ouviu falar em processo de trabalho. A despeito do crescimento exponencial desse mercado, resultado direto do casamento da ciência com a tecnologia, destoa saber que a qualidade de gestão está anos luz de distância das doutrinas da administração moderna. À medida que o tempo passa, em lugar do esperado atendimento agil e eficiente, proliferam características como lentidão, burocracia e despreparo. Se o negócio não fosse privado, os liberais defenderiam a privatização já. Bons tempos aqueles de mamãe. Saía cedo de casa morena para voltar ruiva menos de 40 minutos depois... Exagero? Provo por a mais b, c e o abecedário inteirinho como não estou enxergando as coisas piores do que elas são. No ultimo sábado, por exemplo, decidi retocar as luzes, pintar as unhas e encarar uma depilaçãozinha básica. Basicona mesmo. Nada dessas novidades ultrasexfashionindiana que a gente ouve falar por aí, morre de curiosidade mas não tem coragem de fazer. Na ilusão de que perderia, no máximo, uma manhã do meu dia, pasme..! Cheguei às dez e saí às dezoito. Isso com tudo agendado. Oito horas sentada. Mais precisamente, 480 minutos de Via Crúcis estética. Sabe lá o que é isso? Um expediente inteiro de trabalho. E sem pausa para almoço. Imaginou o mau humor? Agora presta atenção na novela mexicana. Quinze minutos foram embora de cara para que a recepcionista acessasse meus dados no computador, verificasse os agendamentos e chamasse as profissionais responsáveis por cada um deles (no meu salão só trabalham mulheres). Outros quinze, aguardando a chegada das carrascas, fato em muito amenizado por um cappuccino engordiet incluído na conta. Na minha conta, é claro. Eis que surge à minha frente a primeira designer (não se atreva a chamá-lá de cabelereira) que começa a tagarelar sobre novidades, promoções,  cores, tintas e tudo aquilo que te faz interromper uma leitura interessante a troco de nada. "Luzes? A senhora sabia que trabalhamos com mistura de até quatro tons? Fica DI-VI-NO. Bem natural. Até em cabelos castanhos as luzes de mais de duas nuances fazem sucesso. Vale a pena experimentar". Em segundos você se vê em uma ilha cercada de espelhos e catálogos por todos os lados. Depois de perder um tempo enorme folheando tudo, a especialista conclui que a melhor tonalidade para voce é a mesma que havia colocado da última vez. "Não vamos arriscar para garantir o natural. A Rê vai aplicar agora a mistura na raiz, ok?" Entra em cena a ajudante. A pigmentação deve seguir à risca as orientações repassadas pela mestra. Perguntinha inocente: alguma vez na vida você soube repetir com qual diabo de cor tingiram o seu cabelo? Claro que não. A fórmula secreta da Coca-Cola é fichinha perto da matemática química aplicada nos salões de beleza. "Você vai ficar ótima com a 4543.55 misturada com a 9764.89 e um pouquinho da 6589.07 para quebrar o marrom. Garanto que vai combinar com o tom da sua pele." A ajudante chama a ajudante da ajudante para ajudá-la. E lá se vão mais 20 minutos do seu precioso tempo. Em casa você levaria menos de 10. Comigo foram 30. Fora os 20 de espera para a cor chegar ao ponto certo. Outras estações não menos dolorosas se sucedem. Meninas super poderosas materializam-se para cuidar de mãos e pés fatigados. São as manicures, digo, as designers de unhas que, com ajuda dos carrinhos super poderosos, oferecem a você um arco-íris de possibilidades esmálticas, tornando a vida mais difícil do que já é em se tratando de escolhas. Geralmente trabalham em dupla para poupar, segundo elas, o nosso tempo com seus supor poderes. Acredite se quiser. No meu caso, elas finalizaram as tarefas em pouco mais de uma hora, o que trouxe de volta mais reminiscências. Dona Laura fazia as unhas da minha mãe em casa, sozinha, em exatos 45 minutos. Detalhe: mãos e pés. Tem razão. Já não se fazem mais Donas Lauras como antigamente. Alem disso, muita coisa mudou. Só a podologia evoluiu tanto nos últimos anos que agora vem acompanhada de esfoliação, massagem, tecnicas de relaxamento antistress e outras que não me recordo agora. Aparar e pintar as unhas dos pés para calçar uma sandália bonita à noite virou supérfluo em meio a tantas prioridades. Se sobrar tempo, depois de toda a ralação (literalmente digitando) elas cuidam de suas unhas como faria a velha Laura. Para mim, essa etapa durou uma eternidade. Fui obrigada a intercalar tudo com sucessivas lavagens de cabelo e aplicações "parafináticas" em mechas escolhidas aleatoriamente. Para quem conhece a técnica, "puxar luzes" não é tarefa fácil. Muito menos responsabilidade que se delegue a qualquer profissional. É preciso experiência no assunto. E requer amplo domínio das complexas metodologias a base de  papel alumínio, cabo fino de pente e grampos. Todo esse rito processual levou-me, de gorjeta, outras duas horas sem direito a reclamação. Cliente sofredora que se preza não reclama. E foi o que fiz. O comportamento exemplar rendeu alguns brindes de consolação: fofocas, indiscrições, novela das oito, políticos e políticas salariais, receitas de bolo e, como não poderia faltar, conselhos sentimentais. Dei um subtotal rápido. Eram 15 horas e 30 minutos quando a ultima faixa de alumínio foi retirada do meu cabelo. Daí vieram a lavagem, a massagem e a hidratação. Irrelevante dizer que agendei apenas a lavagem. Todo mundo sabe que pintar e não hidratar é o mesmo que sair de férias e não viajar. Não adianta nada. Esse é o código. Para ser aceita no clube você deve aceitá-lo. E compreendê-lo. Lembra a história do "jaquê"? Tipo assim: "Já que a senhora vai hidratar, por que não aproveita a massagem que está incluída na promoção da Wella?" Com isso, juntei à soma 40 minutos e algumas dezenas de reais extras. Aproveitei a pausa da touca para fazer um lanchinho. Estava faminta. Porém, logo perdi o apetite ao lembrar que teria de encarar a escova depois da retirada da máscara capilar. Não havia escapatória. Sair do salão com cabelo pingando é passar atestado de pobreza, segundo as amigas patricinhas. Conheço muitas. "Mais 30 minutinhos, no mínimo", pensei desesperada, prazo que se confirmou em parte, permitindo que, finalmente, eu pudesse seguir para a ultima estacão do meu calvário. A sala de depilação. Normalmente as sessões de depilação giram em torno de meia hora. A minha, prá combinar com a faixa etária, ficou na casa dos 40. Ou seja, lá pelas 17 horas e trinta e cinco minutos alcancei o caixa, não sem antes ser gentilmente convencida a levar alguns produtos para casa, os quais completariam o trabalho feito no salão. Nesse momento veio a curiosidade. Quis entender o motivo pelo qual nenhum estudante de administração teve até hoje a brilhante ideia de propor uma revolução nos modelos de negócio dos salões de beleza. Reengenharia, remodelagem, reestruturação... Qualquer modismo do gênero serviria, desde que terminasse com a expressão "de processos". No dia que fizerem um estudo assim, sugiro iniciar a mudança pela seleção do quadro funcional. Pré-requisito: MUDA. Vedada a comunicação com clientes, avisaria a placa pendurada na recepção. Sugiro, ainda, disponibilizar o cardápio de produtos em meio impresso e digital, contendo tabela de preços e tempo máximo de espera para cada item relacionado no menu, o que chamaria de "melhor estilo Disney de ser". De quebra, iPad (ou minibiblioteca, se você é avessa à onda hightech), café, sala de ginastica e cinema cult. Pequenas grandes ações que transformariam por completo esse ambiente surreal, com o qual não apenas convivemos como também depositamos vez ou outra razoável percentual do nosso salário. Sem falar no principal: o lema da empresa. Proponho uma frase que sintetize a nova estratégia: "Satisfação garantida ou seu TEMPO de volta".

segunda-feira, 6 de junho de 2011

NASCOXISMO

Talvez você não tenha ligado o nome à pessoa, mas posso garantir que o "NASCOXISMO" também faz parte da sua vida. No campo profissional os exemplos pululam. De alegria e sem-vergonhice. Urgente, prioritário, imediato, rápido, já..! São expressões que ouvimos diariamente, cujo efeito pavloviano provoca repetição inconsciente. Seja no restaurante, no posto de gasolina ou na loja da esquina... tudo é prá ontem. Exceto o resultado que fica para sempre. Mais conhecido como "NAS COXAS", o trabalho apressado gera filhos indesejáveis, degenerados e que, cedo ou tarde, terão desperdiçado o investimento financeiro da família. Não é à toa que um grande amigo meu mandou pendurar em seu escritório um poster gigante com a seguinte frase: "A PRESSA PASSA E A MERDA FICA". Não costumo fazer apologia da lentidão ou da incompetência. Muito menos ignoro o fato de que determinadas ações nascem com dead-line, ou seja, com prazo pré-determinado para que aconteçam. De nada adianta, por exemplo, a personalização de embalagens de ovos de chocolate se estes forem entregues aos clientes somente após a Páscoa. Melhor vendê-los em seu formato padrão. Em contraponto, um sistema de informática, cujo objetivo é automatizar o processo produtivo de uma indústria, deve ser muito bem planejado, especificado e disseminado, o que necessariamente consome tempo. Investir em horas, dias ou meses a mais é evitar danos irreversíveis à organização. Nesse caso, a ironia recai sobre o funcionário que, habituado à rotina estressante da falta de prazo, sente-se perdido quando lhe é dada a chance de pensar e planejar suas atividades com antecedência. É possível flagrá-lo fazendo coisas irrelevantes, enquanto deixa de lado aquilo que é prioridade zero. Até que chega o momento em que o prazo se esgota e a demanda volta a circular na esteira das ações ditas prá ontem. Apenas quando isso ocorre é que ele começa a correr atrás do prejuízo. Aliás, correr atrás do prejuízo virou moda, diferencial competitivo, ou se preferir, a especialidade mais valorizada pelos headhunters do momento. O "NASCOXISMO" não é privilégio do ambiente privado. A esfera pública também foi contaminada pela mesma doença, responsável pela mesma fragilidade, mesma indefinição e mesma falta de controle presentes na burocracia do Estado. A causa da enfermidade varia, podendo ser agravada pelo servidor que não trabalha para quem banca seu salário (contribuinte), mas para quem ocupa o cargo hierarquicamente superior ao dele (chefe imediato). De simples diagnóstico, os sintomas do "NASCOXISMO" são inconfundíveis: retrabalho, custos elevados, despesas extras, promoção da mediocridade e visão de curtíssimo prazo. Já os doentes apresentam comportamentos bastante similares. Vangloriam-se de que "entregam qualquer coisa no prazo que for", não importa o que, como ou a que custo. O que me conforta é saber que o "NASCOXISMO" tem cura. Afinal, toda vez que alguém precisa de cuidados médicos os "NASCOXISTAS" são substituídos pelos melhores especialistas do mundo.

domingo, 29 de maio de 2011

Tic-Tac do Amor

Pura perda de tempo essa história de tentar entender o tempo. Ainda no surgir da civilização, já era ele considerado o grande mistério da humanidade. A consciência de sua existência tem ditado a sanidade do homem. Não por acaso, a teoria de que o tempo passa mais rápido a cada minuto ganhou milhões de adeptos em todo o mundo. Surgiram teses de toda qualidade: crenças populares, estudos filosóficos e, até mesmo, teorias científicas.
A rotina, fruto do estresse da vida urbana, é uma dessas teses, tendendo mais para a crendice do que qualquer outra coisa. Segundo ela, acostumados a fazer sempre as mesmas atividades diárias, nossa atenção foi progressivamente desviada para o que chamamos de "piloto automático". Agimos sem perceber o que estamos fazendo. Da mesma forma que o ar enche nossos pulmões para, em seguida, deixá-los sem avisar, a vida enche nossos sentidos sem que possamos percebê-la e aproveitá-la da maneira que gostaríamos. Se o tempo leva embora a vida, por sua vez, a vida leva o tempo embora. O mesmo tempo que falta quando se descobre que 24 horas não são suficientes para tudo aquilo que é preciso fazer. Avolumam-se tarefas registradas no caderninho vermelho, na agenda de couro ou na pasta do outlook. Sempre em número superior àquelas já concluídas, as pendências multiplicam-se como coelhos, enquanto as poucas finalizadas são assinaladas com um X vermelho ao lado. A meu ver míope, o tempo é a tradução humana da vida. E de sua finitude, seja ela analógica ou digital. Independentemente da cultura, sempre haverá quem viva sem tempo para viver.
Outra tese que se propõe a explicar o tempo tem a ver com a diferença entre dia sideral e dia solar, velocidade, circunferência, elipse e outros quetais. Por ela apregoa-se que a rotação da Terra está aumentando. Assim, em vez de 24 seriam 12 o número de horas gastas hoje para o planeta dar a volta em torno se seu próprio eixo. A única vantagem que vejo em acreditar nessa teoria é que, em vez de 44 anos, eu passaria a ter 22. Um desconto de 50%, sem anestesias, cortes ou esticadas doloridas. E o mais importante: de graça! Além de tudo, economizaria o tempo do pós-operatório. 
Para finalizar e evitar que você desperdice ainda mais o tempo do seu domingo, depois do empate desperdiçado do Mengão com o Bahia, eis um conselho que considero atemporal: nunca tente entender ou controlar o tempo. Corte caminho pela via do amor. Só o amor tem o poder de parar o tempo e fazer você sentir tudo de novo...

vida

porto inseguro
do além-mar
viajo impuro
a sonhar

domingo, 15 de maio de 2011

Os 3 Ps da Gestão Pública

Tempos atrás escrevi um artigo sobre gestão empresarial no qual citava o tripé da sustentabilidade. Conhecido no meio acadêmico como triple bottom line, esse modelo trouxe para as organizações a consciência de que nenhuma empresa consegue sobreviver ancorada apenas em resultados medidos pelos demonstrativos contábeis. Duas outras vertentes são essenciais à estratégia. Uma diz respeito ao viés social, ou seja, ao retorno dado à sociedade em função do crescimento do negócio. A outra, cada dia mais forte, revela que não basta dar lucro e manter programas desenvolvidos no campo da responsabilidade social. Para garantir um lugar ao sol, as empresas devem também cuidar do meio ambiente, sob risco de deteriorarem, além da matéria-prima, outro ativo ainda mais relevante: sua reputação.
Na área publica as necessidades em termos de gestão estratégica são similares ao modelo privado, do qual guarda enorme distância. Um dos motivos é o fato de que, ao desenvolver e implantar uma política pública, o gestor, independentemente da esfera de atuação, não se preocupa em institucionalizá-la ou torná-la perene. Sua visão é predominantemente difusa, com objetivos de curtíssimo prazo. Nem sempre fica claro onde se quer chegar. Faltam projetos estruturantes, que ajudem a resolver problemas de interesse coletivo e promovam o desenvolvimento sócio-ambiental do município, estado ou país. O gestor publico não é preparado para perceber que tudo está interligado, não existindo mais política de governo que não seja intersetorial. Assim como nas empresas, a qualidade do resultado ocorre em função da qualidade do modelo de gestão. É preciso pensar política pública considerando o mesmo tripé do meio empresarial privado; sobretudo, propor ações governamentais articuladas, que não desconsiderem na sua matriz de análise possíveis impactos ambientais negativos ou piora dos indicadores sociais. 
Inspirar-se nas boas praticas privadas é um bom caminho. Sistemas de medição de desempenho empresarial podem ser adaptados para a área pública. A exemplo do Balanced Scorecard de Kaplan e Norton, há que se desenvolver um painel de controle para monitorar os processos internos do setor público, a performance das equipes, a capacidade de inovação e os avanços tecnológicos. Ainda dentro do BSC é imprescindível buscar o desejável equilíbrio entre medidas financeiras e não-financeiras, tendo como meta prioritária a elaboração de políticas públicas sustentáveis.
Eu, com minha mania de simplificar tudo, recomendo que se responda cinco perguntinhas básicas antes de se colocar na rua um novo bloco da políticas públicas:
1) quanto custa para a sociedade?
2) o que o cidadão ganha no curto, médio e longo prazo?
3) quais os impactos ambientais e retornos sociais esperados?
4) os processos são racionais ou se pretende informatizar o caos?
5) os resultados são passíveis de medição?

sexta-feira, 13 de maio de 2011

O que é ARTE?

Pigmentos, fotogramas, animações, letras, formas, designs, movimentos, ângulos, rimas, gravuras, desenhos, sons, silêncios, performances, libretos, aquarelas, moldagens, insigths, coreografias, pixels, roteiros, cifras, odes e elegias...

Qualquer que seja a linguagem, a verdadeira ARTE está em saber CONTAR HISTÓRIAS!

quarta-feira, 11 de maio de 2011

É o fim do mundo..!


Fiquei sabendo hoje que o fim do mundo foi antecipado. De 2012, conforme nos revelou John Cusack há dois anos, veio para 2011, exatamente no próximo dia 21 de maio, segundo um grupo cristão norte-americano chamado Family Radio. Eu achei que o fim do mundo aconteceria no dia da morte de Bin Laden mas, felizmente, nada aconteceu. Minha mãe sempre acreditou na velha profecia “mil passará e dois mil não chegará”, atribuída a trechos bíblicos e a Nostradamus. Passaram-se 11 anos da virada do milênio e a vida continua passando bem, obrigada. Minha avó disse para minha irmã que o fim do mundo havia chegado quando ela entrou em casa rebolando com seu fio dental azul. Não o higiênico, o outro..! A escatologia assusta, atrai, incita, inspira e, se dela duvidar, pira também. O que me fez escrever este post foi a necessidade de dividir com você o resultado de uma pesquisa recentemente realizada para descobrir qual a primeira coisa que as pessoas fariam se tivessem certeza de que a roda da vida deixaria de girar. A maior parte largaria o trabalho na mesma hora, o que não surpreende, já que a resposta coincide com outra sobre o que fariam se ganhassem na loteria. O mais curioso está nas respostas dadas pelas minorias. Os avarentos, por exemplo, gastariam a poupança de uma vida inteira em bares, shoppings e restaurantes. Em paralelo, os banqueiros subiriam os juros diante do súbito aumento da demanda provocada pela falta de juízo final. As anoréxicas, bulímicas e gordinhas complexadas trocariam o regime da sopa pelo rodízio de pizza com sorvete de açaí, banana e granola grátis. Os mais românticos correriam para os braços da família e descobririam coisas sobre ela que jamais ousaram imaginar. Os mais afoitos se suicidariam, certos de que “não se deve deixar a morte para o dia 21 se você pode morrer hoje”. Os revolucionários tentariam mais uma vez salvar a pátria antes que ela fosse para o espaço junto com o planeta. Os intelectuais, de esquerda e de direita, seriam unidos pelo centro da loucura que os obrigaria a escolher o derradeiro livro, o último filme, a música final que curtiriam na passagem para a eternidade. Ops! Falha técnica. Intelectual que se preza não acredita em eternidade, o que dá a eles ainda mais razão para perderem de vez a razão. A geração y surfaria nas ondas da net até o último byte do dia 20. As crianças comemorariam o primeiro Natal fora de época. Os artistas trocariam a arte pela vida pouca que lhes resta. Os otimistas achariam um jeito de explicar a todos o lado bom da morte. Os botafoguenses botariam fogo na camisa do time, já que a esperança da vitória não seria mais a última a morrer. Por fim, para não dizer que não falei das flores, os mais espertos, sensatos e equilibrados fariam sexo até a chegada do dia D...

quinta-feira, 21 de abril de 2011

Em que posso ajudar?

- Serviço de Atendimento ao Cliente, bom dia! Em que posso ajudar?
- Gostaria de fazer uma reclamação.
- Ok, senhor, um instante que vou transferir sua ligação para o setor responsável.

(10 minutos de espera e a ligação cai)
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- Serviço de Atendimento ao Cliente, bom dia! Em que posso ajudar?
- Liguei há pouco para registrar o defeito de um produto e...
- Um minuto que estou transferindo sua ligação.
- Espere! Espere!!!

(15 minutos de espera e a ligação cai)
-------------
- Serviço de Atendimento ao Cliente, bom dia! Em que posso ajudar?
- Olha aqui: se essa @&$@& cair de novo eu não respondo por mim!!!
- Acalme-se, senhor. Em que posso ajudar?
- Já disse mil vezes: quero fazer uma reclamação. Eu fiz uma compra e...
- Sr., aguarde um instante que vou transferir sua ligação.
- Não se atreva! Vai se arrepender se me transferir de novo. Quero falar com o supervisor agora!
- Pois não, Sr. Vou transferir para o setor de supervisão.

(20 minutos de espera e a ligação cai)
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- Serviço de Atendimento ao Cliente, bom dia. Em que posso ajudar?
- Quero dar queixa contra essa $&@@& de empresa e simplesmente não consigo!!!
- Sr., infelizmente terei de transferi-lo, pois o setor que cuida disso é outro.
- E vocês cuidam do que, afinal?
- Nós fazemos a triagem.
- Ah, sei. Vocês transferem as ligações dos clientes para os setores certos, certo?
- Certo. Certíssimo, senhor.
- Não seria mais barato comprar uma URA?
- Desculpe, senhor, uma o que?
- Unidade de Resposta Audível.
- Não conheço, senhor. Deve ser tecnologia nova.
- Não, meu filho, é tecnologia velha mesmo. E bota velha nisso!
- Engraçado... O Sr. falando assim... sua voz... lembra alguém. Qual é o seu nome?
- Felipe???
- O nome do senhor é Felipe? Então é meu xará!
- Felipe? É você? Xará coisa nenhuma. É teu pai que tá falando. Não reconheci tua voz. Desde quando vc trabalha? E a faculdade?
- Ih, paizão, transferi para a noite. Daí consegui esse bico prá ganhar um troco. Sabe como é, né? A mesada anda meio curta.
- Presta atenção, moleque: não vou discutir isso agora. A gente conversa em casa. Ai..! Que pontada!
- O que foi paizão?
- Nada. É a safena. Não posso me estressar. Chega de enrolação e me ajude a registrar a queixa logo.
- Queixa? Que queixa?
- Contra a @&$&@ da empresa, ora!
- Ah! Espera um pouquinho que vou te transferir.
- Vai mesmo? Olha que sou teu pai e não um cliente qualquer!
- Ô pai... Mesmo que não fosse, né? Cliente tem sempre razão aqui no SAC. Peraí...
(30 minutos de espera e a ligação cai)

-----------
- Emergência Hospitalar, bom dia! Em que posso ajudar?
- Acho que estou tendo um ataque e preciso de uma ambulância urgente.
- O que aconteceu, senhor? 
- Estava tentando fazer uma reclamação no SAC e...
- Ah! Serviço de Atendimento ao Cliente? Um momentinho, por favor.
- Não... Por favor, não transfira! Arg..!

(40 minutos de espera e a ligação cai)
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- Serviço de Atendimento ao Cliente, bom dia. Em que posso ajudar?
- Fe... lipe... preciso... falar... ele...
- Como? O Sr. poderia repetir, por favor? A ligação está cortada.
- Res... pirar... eu... eu não... con sigo... res... sigo!!!
- Recibo? Um instante que vou transferi-lo para o setor responsável.

(10 minutos de espera e a ponte cai)

terça-feira, 19 de abril de 2011

Qual bullying ???


Em uma escala que vai da inconveniência à crueldade, o bullying está muito mais presente fora da escola do que se imagina. Ele nasce da falta de educação. Cresce alimentado pelo preconceito. Manifesta-se, nos casos mais raros, por meio de atitudes que beiram o sadismo. Não importa a idade, sexo ou time para o qual se torce, em maior ou menor grau, somos ora vítimas ora algozes dessas agressões rotineiras que se convencionou chamar de bullying. A questão é: qual tipo de bullying estamos tratando? Em casa, com irmãos ou primos, quem nunca presenciou uma cena de bullying familiar? Sabe aquela menina séria, gordinha e que usa óculos “fundo de garrafa”? A recordista de apelidos? Não é difícil imaginá-la. Minha miopia foi durante anos motivo de gozação de parentes. Nas festinhas da adolescência, quem nunca viu o rapaz tímido e franzino ser constantemente isolado pelos grupinhos que o consideravam “out” e certinho demais para fazer parte da turma? A isso chamamos bullying social? Duvido que no trabalho não se tenha, alguma vez, presenciado a pressão psicológica das equipes sobre o empregado novato; aquele cara que discute tudo, pergunta tudo e quer sempre inovar. O coitado é alvo certo do bullying empresarial (esse o Google conhece). Se aprofundarmos o assunto, podemos chegar às perseguições religiosas, traçando sua evolução da Idade Média até o novo Milênio. Bullying sagrado? Teológico? Ainda não inventaram o nome certo para essa e outras intolerâncias. Até bullying geográfico (ou regional, se preferir) existe por aí. Em SP, todo nordestino é “baiano”. No Rio, “paraíba” atende melhor. Pior mesmo são os candangos. Sofre quem nasce ou mora na capital da República. O que deveria ser motivo de orgulho, é razão de constrangimento, ofensa e até humilhação. Brasília é tida indevidamente como reduto de corruptos e criminosos. Contra ela o bullying é intenso, especialmente o bullying jornalístico, praticado pela imprensa que se autoproclama nacional. Para completar minha lista bullymática, chamo atenção para um tipo que tem se revelado extremamente perigoso: o bullying ideológico. De risco epidêmico, seus efeitos colaterais são tão devastadores que ameaçam qualquer pacto social. É de longe o mais cruel. Ao padronizar o pensar, o bullying ideológico também escraviza, sem pensar...

sexta-feira, 15 de abril de 2011

Ditadura do Novo & Ineficiência

Devia ter estudado Direito. Gosto de leis. Gosto de analisá-las, vislumbrar melhorias e detectar vazios legais. Sim, meus amigos, os vazios existem. E não são poucos. Ontem mesmo pensei em duas novas leis que fariam enorme diferença no modelo nacional de gestão pública. Uma delas proibiria o gestor público de iniciar novo projeto antes de terminar outro de igual escopo que se encontre em curso na sua área de atuação. Isso faria com que priorizasse a melhoria dos processos atuais, informatizando-os, reduzindo custos e simplificando a burocracia, tudo com foco na qualidade do serviço prestado ao cidadão. Novos Programas, Políticas, Projetos e demais "Pês" teriam de aguardar a conclusão dos anteriores para serem implantados. Enxergo hoje profissionais do Estado mais preocupados em imprimir suas marcas (já ouviram essa expressão antes?) do que fazer bem feito o serviço para o qual foram contratados, na maioria das vezes trocando seis por meia dúzia.
A segunda lei proposta por mim estabeleceria novas competências aos órgãos fiscalizadores da União. Dentre elas, auditar o desempenho profissional do funcionário público ocupante de cargo de liderança, penalizando-o por eventuais omissões ou atrasos injustificáveis no exercício de suas atividades diárias. Ainda não posso provar, mas aposto o que for, com quem quer que seja, que o custo da ineficiência no Brasil é muito maior que o da corrupção. Longe de querer amenizar o que já é considerado crime previsto no Código Penal, a idéia da nova legislação é também punir com multas e outras sanções servidores que não se comprometem, não se empenham, não trabalham as horas pelas quais são remunerados, procrastinam a solução de problemas simples, criam dificuldades para vender facilidades ou, o que é mais grave, aceitam assumir cargos de extrema responsabilidade para os quais não possuem nenhuma competência instalada. Geralmente sabem disso mas, por vaidade, ambição ou poder, aceitam o desafio imposto, transferindo para o povo o ônus de sua ineficiência. Independentemente de apresentarem resultados concretos para a sociedade, cumprirem as metas definidas nos planejamentos anuais, fazerem juz aos cargos que ocupam com seriedade e postura ética - lembrando que ali estão para servir ao público e não para dele se servirem - é comum esses profissionais deixarem os respectivos postos de trabalho, depois de anos e anos sem apresentar nenhum resultado, totalmente imunes a qualquer ação de improbidade administrativa que porventura possa ser movida contra eles. Previsível. Segundo as leis brasileiras, servidores medíocres que cumprem à risca suas rotinas burocráticas, dentro dos limites normativos aos quais estão sujeitos, não precisam se preocupar com auditorias ou fiscalizações futuras, ainda que tenham interrompido ações já iniciadas para começarem outras com o mesmo propósito. A constatação de tamanha mazela induz à indignação e provoca alguns questionamentos: quanto prejuízo esses gestores causaram ao Estado por deixarem de atuar em prol do cidadão? quanto extorquiram da União ao deixar de gerir seus processos da forma como deveriam ser geridos? quanto usurparam do trabalhador brasileiro, via impostos, por receberem salários incompatíveis com sua produtividade? Um dia esses números serão revelados. Quando isso acontecer, talvez possamos destituir do poder o "Novo" e, em seu lugar, eleger democraticamente a "Continuidade com Eficiência". O cidadão aplaude. O contribuinte agradece. O país comemora..!

sexta-feira, 8 de abril de 2011

Anjos de Realengo

Anjos de Realengo
Duas preces eu oro

Que tuas vidas não sejam em vão
Que elas tornem o homem são
Deus, eu te imploro..! 

Que tuas mortes ontem despertas
Sejam para o mundo mais que alerta
Deus, eu te imploro..!

segunda-feira, 4 de abril de 2011

Duda Língua Solta 2



O Japão vai reconstruir o país inteiro antes de o Brasil terminar os estádios para a Copa.

(diretamente do facebook do novo correspondente oficial do blog da Tina)

domingo, 3 de abril de 2011

Já que o assunto é preconceito...

...por que não aproveitar para falar de preconceito?

Tenho mania de ler tudo. Bula de remédio, manual de celular, carta de leitor no jornal de domingo etc. Até a Constituição eu já li. Minha obrigação? Pode ser. Porém, cá entre nós, você bem sabe que sou exceção. Como dizia, nossa amiga lembra-nos que um dos principais objetivos do País é "promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação". Perceberam? A primeira palavra é origem, seguida de raça, sexo, cor, idade e outros. Existe preconceito de origem no Brasil? Temo que sim. E temo que não seja pouco. Contra nordestino, é claro. Você já se referiu a algum brasileiro como sendo sulista, centroestista ou sudestino? Aposto que não. No máximo, usou nortista como forma de designar aqueles que nasceram nas regiões norte ou - pasme! - nordeste também. Isso é preconceito. De origem. De um lado, o cuidado em não confundir gaúcho com paranaense. De outro, a falta de distinção entre baiano, cearense, pernambucano etc. O uso indiscriminado do termo nordestino nada mais é do que puro desprezo.
Outra lembrança que nos traz a Constituição diz respeito a um de nossos direitos fundamentais: "é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias". Taí um tema do qual, com ou sem óculos, só enxergo preconceitos. Explico. Além da forte discriminação em relação a determinadas religiões, existe um pobre "cristão" que paga o pato mais do que todos os outros. Ele mesmo. O ateu. Ou o à toa, se preferir o trocadilho popular. Esse sujeito, o ateu, vive há séculos no anonimato e tudo indica que não sairá de lá tão cedo, sob pena de perder amigos, colegas de trabalho e até mesmo a família, todos implacáveis na defesa desses e outros preconceitos arraizados em nossa cultura.
Falando nisso, não posso esquecer de mencionar o preconceito estético (invenção da autora), cujo domínio social, há tempos, ganhou o mundo. Dois exemplos. Para serem "aceitas" em seu meio, crianças trocam a necessária e saudável atividade física por cirurgias plásticas milagrosas. E como forma de manterem o padrão, mulheres "alugam" o corpo de suas mães para gerar seus próprios filhos. Ou seriam irmãos? O comportamento preconceituoso de nossa sociedade causa estupor. Cada vez mais, vejo o quanto somos manipulados pela indústria da beleza. A busca da "perfeição" materializa-se sob a forma de preconceito. Homens e mulheres sacrificam-se em nome de um ideal estético que, para a felicidade de poucos, faz a infelicidade de muitos...

terça-feira, 29 de março de 2011

Homens!!!

Comemoravam um ano de namoro.
Ele, 28 anos, sentia-se bem. Ela, 25 anos, não...

- Você quer mesmo sair para jantar?
- Por que a pergunta? Você não quer?
- Nada disso. Só perguntei porque estou te achando estranha hoje.
- Estranha como? Não gostou da minha roupa? Ah! Já sei! Não gostou da cor do meu cabelo, né?
- Você pintou?
- Não reparou? Gastei meu dinheiro todo e você sequer notou a diferença?
- Hum... hum ... Agora que falou... está mesmo diferente.
- Diferente, diferente... Diferente não é bonito.
- Mas está bonito!
- Não adianta. Você disse diferente e não bonito.
- Puxa como você complica, hein? Diferente é diferente. Nem bonito, nem feio...
- Mais alguma queixa? Parece até que está arrumando motivo prá gente brigar. O que foi? Tem jogo hoje?
- Não!!! Que saco! Vamos logo ou perderemos a reserva.
- Se for só para não perder a reserva, eu não vou. Você quer ou não quer sair hoje?
- Quero. Quero muito.
- MENTIROSO. Homem é tudo igual.
- O que eu fiz? Você está agindo feito uma maluca.
- Agora eu sou a maluca, né? Você deixou de me amar. Isso sim. Quer terminar o namoro e não tem coragem!
- Se eu quisesse terminar, por que estaria aqui hoje para comemorar um ano juntos?
- Porque não quer me magoar.
- E não quero mesmo.
- Viu? Eu sabia!
(pausa para lágrimas)
- Princesa, vou te contar um segredo sobre os homens.
- ???
- Quando a gente quer ficar com alguém, a gente fica.
- Sei... E quando não quer ficar?
- A gente NÃO fica.
- Simples assim?
- É.
- Que mais?
- Quando a gente diz uma coisa, a gente quer mesmo dizer aquela coisa. Nem mais, nem menos.
- Sério?
- É.
- Conta mais. Conta mais... rs
- Isso é o principal.
- Quer dizer que se você não me ligar amanhã é porque não quer mesmo ligar? Não é só charme?
- Homem que é homem não faz charme.
- Se você tivesse outra mulher me contaria?
- Não.
- Então você tem outra?
- Não!
- Como vou saber se é verdade se você mesmo disse que não me contaria?
- Não vai saber, mas não se preocupe. Se um homem quiser mesmo ficar com uma mulher, ele pode até dar uma escorregadinha por aí, mas vai continuar com ela.
- E se estiver apaixonado pela outra?
- Ficará com a outra.
- Mas isso é muito racional!!!
- Pois é... Vamos?
- Qual restaurante você reservou?
- O mesmo onde nos conhecemos.
- Que romântico! E depois? O que faremos?
- Uma suíte romântica nos espera...
- Você reservou motel também?
- Claro!
- Então você não quer sair comigo. Quer outra coisa!
- Não gostou da surpresa?
- Não. Me sinto um verdadeiro "jantar ambulante".
- Podemos ir direto para o motel, se preferir...
- Eu sabia! Eu sabia! Quer transformar esta noite em um jantar de despedida, né? Pois não vou deixar acontecer. ESTÁ TUDO TERMINADO ENTRE A GENTE!

Comemoravam um ano de namoro.
Ele, 28 anos, sentia-se mal. Ela, 25 anos, não...

Duda Língua Solta



"Roubar idéias de uma pessoa é plágio.
Roubar de várias é monografia..."

(Duda é o novo correspondente do blog da Tina)

sábado, 26 de março de 2011

O Milagre do Pão de Queijo

Mais de uma hora no aeroporto. Passou pelo portão de embarque rumo à revista obrigatória. Retirou os óculos. Depositou-os na bandeja com o celular, a carteira, cinco moedas e o velho relógio de prata, companheiro de todas as horas. Checou os bolsos. Sentiu o gelo do metal frio enrijar os dedos. Apalpava a prótese tentando lembrar a última vez que a tirara da boca. Meia hora atrás, se muito. Acontecera no bar. Pedira um pão de queijo para acompanhar o expresso. Sendo nova a peça, teve receio de danificá-la. Longe do alcance dos olhares curiosos, puxou-a de supetão, escondendo-a no bolso, enrolada ao guardanapo. A lembrança foi cortada pelo tom áspero. "Sr. é a sua vez!" Acelerou o passo, ultrapassando a faixa amarela. O alarme soou alto. Olhares indiscretos censuravam calados o senhor de barba branca que atrasava a fila. "Por favor, retorne à faixa e passe outra vez pelo detector de metais." Mesmo percurso; mesmo desfecho. Apenas o alarme pareceu-lhe outro, de maior duração. Retornou ao ponto de partida. Menos por cortesia e mais por querer livrar-se do problema, a segurança ofereceu a opção de passar os sapatos pelo Raio X ou seguir direto para a inspeção. Exasperou-se. "Minha senhora, desse jeito vou perder o vôo. Já esvaziei os bolsos. Depositei todos os meus pertences na bandeja. O que mais quer? Que tire a roupa?" A funcionária olhava-o com desconfiança. Sabia de casos de sequestros, tráfico de entorpecentes e ações terroristas praticados por cidadãos comuns da terceira idade. "Sr. não vou deixá-lo embarcar enquanto não descobrir o que está acontecendo". Tirou os sapatos. Atravessou o corredor como um condenado, implorando a Deus pelo milagre que não veio. O som agudo foi suficiente para reforçar o antigo ateísmo. Três novos seguranças posicionaram-se ao lado de sua algoz. "O Sr. tem certeza que esvaziou mesmo os bolsos?" Ao que respondeu bastante irritado. "É sempre assim. Preferem duvidar da gente a imaginar qualquer defeito no equipamento". O clima frio fora do aeroporto pouco amenizava o clima quente de dentro. "Infelizmente temos de revistá-lo. Queira dirigir-se à cabine, por favor." Exausto, aproximou-se do balcão. Sussurrou. "Eu sei o que fez soar o alarme. Foi minha prótese!" A equipe deu um passo à frente. Pediu que repetisse o que dissera. O zum zum zum das reclamações era ensurdecedor. "Foi a minha prótese!", repetiu mais alto. "Como?", retrucaram os quatro, em uníssono. Explodiu. "Minha dentadura! Den-ta-du-ra!!!" Para manter o comando, a segurança conteve o riso. "Sr., peço-lhe que coloque a dentadura na bandeja para que possamos liberá-lo." A crueza da ordem tirou-lhe o chão. Toda sua vergonha seria depositada ali. À frente de todos. Respirou fundo. Manteve a dignidade. "Minha senhora, em 45 anos de casado, nunca mostrei esta prótese sequer para minha esposa! Não será a senhora a primeira mulher que irá vê-la!" Saiu da fila de queixo erguido e sorriso seguro no bolso. Chegou em casa. A viagem era por conta das férias. Sua família o esperava na praia. Refletiu sobre a dificuldade que teria para comprar nova passagem. Girou a maçaneta e entrou. Largou a maleta no chão. No ar, cheiro de algo ainda queimando. Vinha da área de serviço. Percebeu pela nuvem de fumaça. Deixara o ferro ligado à tomada, em cima da tábua de passar roupa. Por pouco teria provocado um incêndio. Sabe-se lá de qual proporção. Por pouco estaria sentado em pleno vôo, sem saber que perdia a casa e, com ela, sua aposentadoria. Por pouco Deus o teria convertido cristão. Mas a personalidade desconfiada o fez acreditar em outro milagre. Fora salvo por um simples pão de queijo.
E por pouco, muito pouco...

Acredito no Amor

acredito no Amor
só no Amor

sem Amor
o Homem duvida
o Homem mata
o Homem tomba

por Amor
o Homem volta

no Amor acredito
no Amor, só

terça-feira, 15 de março de 2011

Retrato de Amor

Nada a preocupava mais do que deixar a pequena Rosa aos cuidados de seu velho pai. “Carrancudo como é irá fazê-la chorar”, pensou aflita, enquanto pegava a bolsa em cima do aparador e as receitas médicas espalhadas na superfície do mogno escuro. Quatro anos comemorados dia anterior e Rosinha ainda se via às voltas com bexigas coloridas sobreviventes, perseguindo-as por toda a casa. As mais ousadas perdiam o ar da vida durante a fuga, restando secas e inertes até a chegada do resgate adulto. Uma a uma, eram cuidadosamente descartadas. Sem compaixão. A cada estouro, seguia-se a risada alegre de menina travessa, desprovida de culpa ou remorso. A febre deixara suas bochechas ainda mais rosadas. Tanto que pareciam pintadas por um artista circense, compelido a colorir a menina-anjo cuja falta de asas não a impedia de voar. Pelo contrário. Pulava sofás, ultrapassava cadeiras e escalava mesas com a destreza de exímia alpinista. As feições perfeitas lembravam uma boneca de louça antiga. Dessas que, só de olhar, tem-se medo de quebrar. Mesmo debilitada, a menina corria livre pela sala, jogando para o alto as revistas semanais que alguém perdera tempo organizando na estante. “Querida, não faça isso. Comporte-se. Mamãe vai à farmácia comprar os remedinhos da princesa e volta já.” Partiu apressada, sem tempo de perceber o beiço tremular e a lágrima indecisa da filha. Mais precisamente, era uma mini-lágrima, que se recusava a correr rosto abaixo. Sentado na velha poltrona xadrez, o avô lia indiferente à presença da pequena. Tinha aversão a crianças. Rejeitara a vida inteira a idéia de ser pai. Se aconteceu foi por pura falta de sorte ou descuido, comentara várias vezes com os amigos mais próximos. “Eu avisei que não queria filhos”, culpava a esposa, enquanto estremecia com a capacidade singular de ferir quem o amava. Há muito deixara de mentir para si mesmo. Abrira mão da prerrogativa antes do prazo. Ficara viúvo e tivera a infelicidade de ver sua única filha engravidar após brevíssimo romance com um poeta desempregado. Na verdade, um desempregado que se dizia poeta. Tal era a mediocridade do desocupado que, tão logo soube da notícia, deixou a namorada com a mesma velocidade com que a conquistou. Baixou os olhos e somente então percebeu duas grandes "bolas de gude" encarando-o. Sim. Rosinha era mesmo uma boneca. Desviou a atenção para o outro lado. Percebeu a aproximação lenta, porém obstinada. Voltara a ler enquanto a observava de soslaio. Ela contornara a poltrona, disfarçando os movimentos, até alcançar a escrivaninha do avô. O suspense chegou ao fim quando Rosinha, em um pulo audaz, puxou a gaveta da mesa com a determinação de quem imaginava haver ali um tesouro escondido. O objeto desprendeu-se do móvel e foi ao chão, levando com ele papéis, canetas, talão de cheque, recibos de cartão de crédito e até a cópia do imposto de renda do ano passado.“De novo a mesma cena. Droga!”, exclamou zangado, chamando a atenção da flor que o desafiara. Preparou-se para a reprimenda quando o passado descortinou-se à sua frente, trazendo a filha na mesma idade, abrindo a mesma gaveta e espalhando, escritório afora, os mesmos papéis de nenhuma importância. Naquela época a reação fora instantânea. Puxou-a pelos cabelos e fez com que, aos soluços, guardasse tudo de volta, convicto de que o objetivo maior de dar-lhe boa educação respaldaria qualquer reação desproporcional que tivesse adotado. Não era culpa sua. Crescera fazendo parte de um ambiente político contaminado por interesses pessoais que, em nome de um pseudo “bem maior” sobrepujavam interesses verdadeiramente coletivos. Retornou ao ponto em que se achava. Entre o déjà vu e o impulso contido veio a pergunta inocente: “Vô, eu posso te desenhar?” Tamanho atrevimento pegou-o desprevenido. A descoberta de que ele existia e, mais ainda, despertava o interesse da neta dirimiu suas defesas. Fez sinal de assentimento com a cabeça e ficou ali, encostado à parede. À espera. Rosinha levou menos de quinze minutos para terminar o retrato e, em meio à desordem, entregou orgulhosa a obra-prima, acompanhada de um beijo sorridente. Ali estava ele. Via-se como no espelho. Sentado na poltrona xadrez. Os óculos levemente enviesados, segurando com uma das mãos um livro aberto de capa azul e letras douradas. A outra mão, caída displicente ao longo do corpo, quase não se deixava notar. O que mais o intrigou foi o feitio da boca, em formato de “u” ao contrário, o qual revelava o quanto a neta lhe dedicava atenção. Ao passo que, para ele, começara a conhecê-la naquele instante. E o fato de ter passado os últimos quatro anos sem sentir o que agora sentia fez com que quisesse compensá-la de tudo, entregando-se àquela sensação que só experimentara na infância e que viera a abandonar logo depois. Ali, agachado perto da pequena Rosa, sentiu-se novamente Desabrochar...

sábado, 12 de março de 2011

A lei do Carnaval

Dizem que no Brasil o ano só começa depois do Carnaval.
Se isso não é verdade, deveria ser. E mais. Deveria haver uma lei obrigando todos os países do mundo a brincarem o seu próprio Carnaval.
Convém aos povos e nações terem um rito de passagem como esse a cada início de ano. Funcionaria como uma espécie de banho de humanidade, com cheiro de música e serpentina. As pessoas poderiam comemorar juntas a liberdade. Aquela genuína liberdade de poder libertar um ao outro. Ao som do axé regado ao dendê, do arrasta-pé dos bonecos gigantes, do samba trigueiro e de todos os outros gingados que compõem nossa bateria verde e amarela. A folia pulsaria em nossas veias e abriria alas para o sangue percorrer a avenida do corpo, lembrando que ainda estamos vivos. Dançaríamos até perder a razão, e mudaríamos o ritmo de nossas escolhas, cada dia mais egocêntricas e descompassadas.
Felicidade ou Segurança? Provoca-nos a enquete do blog. Sob qual referencial escolher? Nosso? Do outro? Embaixo ou em cima das árvores? É preciso coragem para por e tirar fantasias, conforme a perspectiva que nos é revelada. Quem me ensinou isso foi Cosme, o Barão de Rondó, cria do escritor Italo Calvino que, cá entre nós, também gostava de Carnaval ou não teria imaginado uma aventura inteirinha pulando personagens de galho em galho, sobrevivendo à VIDA com paixão. Falando Nela, eis o segredo! Apaixonar-se sempre, como faz o verdadeiro folião. É por isso que defendo a tal lei, que transformaria o Carnaval em vacina obrigatória, com validade de um ano e 100% eficaz contra os vírus do PESSIMISMO, da MESQUINHEZ e da INDIFERENÇA.

domingo, 27 de fevereiro de 2011

Não existe crise da meia idade

Descobri uma coisa hoje.
Não existe crise da meia idade. Crise tem início e fim.
Mas a tal crise que se convencionou chamar de meia idade é outra coisa. Tem a ver com o momento em que a vida se despe para você. Sem pudor, constrangimento ou vergonha. Você simplesmente a vê. Tal qual ela é. E não ruboriza. Daí, para amenizar a dor da descoberta, você pensa: "Ah! É a crise da meia idade!" A explicação é seu porto seguro. Como se sabe, toda crise passa. O problema é que "essa" não passa. Essa fica impregnada no corpo, igual perfume novo. Essa coisa, que é tudo menos crise, tem o poder de transformar certezas em dúvidas, conhecimento em ignorância, construções em fantasias. Todo o ser passa a não ser mais. Porque você não o reconhece mais. A sensação é perigosa. Você sente medo. Prefere apagar a luz e voltar a ser feliz. Como antes. Quando isso acontece, lá no escuro, você sabe que está apenas brincando de esconde-esconde. Um dia a brincadeira acaba e você finalmente descobre.
Ou é descoberto...

quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

Educação Nota 10


- Pai, não joga cigarro na rua!
- Não amola, filha! Tô sem paciência hoje. Senta aqui um pouquinho com o pai prá descansar.
- Esse banco é nosso, pai?
- Não. Já te expliquei que tudo que tá na rua não é nosso.
- Por que não, pai?
- Porque a gente não comprou com nosso dinheiro. Não podemos levar o banco para casa.
- Mas não existem coisas que são de todo mundo?
- Não sei. Nunca pensei nisso antes.
- A professora disse que a gente não pode riscar o banco porque ele é nosso. E que a gente tem que cuidar de tudo o que é nosso.
- Ela disse, é?
- Disse. E disse também que é errado jogar lixo na rua.
- Sei... A gente não deve sujar a rua.
- Porque a rua também é nossa.
- Que mais ela disse?
- Dizer...dizer... mais nada. Mas ela fez.
- Fez o quê?
- Não deixou eu levar papel higiênico da escola para brincar no recreio.
- Por que não?
- Porque ela disse que o papel era prá ser usado por todo mundo. E se eu desperdiçar meus pais vão pagar mais imposto e vai sobrar menos dinheiro prá ir ao cinema.
- Uééé? Mas então o papel higiênico não é nosso! É de todo mundo!
- Não, pai. Você não entendeu. A gente tem que deixar lá porque tudo que é nosso é também de todo mundo. Ela disse que o papel é "público".
- Sei...
- O que é público, pai?
- Sei lá! Público significa do povo... eu acho.
- Então sé é do povo é nosso e a gente tem que cuidar.
- Até parece! Teu pai já trabalha feito um escravo e agora também é obrigado a cuidar de tudo que tá na rua. Isso é papel do Governo!!!
- Não, pai. O papel não é do Governo. É nosso! Eu peguei no banheiro da escola.
- Ai, filha. Não complica. Vamos mudar de assunto?
- Pai, não fica brabo! A professora disse que é fácil cuidar do que é público. É só não estragar as coisas e limpar o que a gente sujar por aí para que os outros possam usar depois.
- Tá...tá...tá bom..! É só isso?
- E não esquecer de cuidar das árvores.
- Só?
- Só.
- Então pede prá tua professora, que entende tudo, fazer a relação do que é público no Brasil e que todos devem cuidar. Mas pede prá ela escrever no papel, tá? he he he!
- Não é que você adivinhou, pai? Foi esse o dever de casa que ela passou ontem prá gente. E eu tirei nota 10!
- Ah filha... que bom! E o que você fez para tirar 10?
- Eu desenhei o mapa do Brasil bem grandão e coloquei dentro a nossa cidade, a rua que a gente mora, o sinal de trânsito, a calçada, o poste de luz, a quadra de esporte, o lugar onde o prefeito e a polícia trabalham, o hospital e outras coisas que tô esquecendo agora...
- E coube tudo?
- Claro que não. Mas ela me deu 10 assim mesmo porque eu expliquei prá ela que o Brasil de verdade era muito maior do que o Brasil do meu desenho.
- Hum hum...
- Pai?
- O que é filha?
- O Brasil é nosso?

(Ilustração: Carlos Eduardo Cunha - www.ceduardocunha.blogspot.com/ )

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

A Multiplicação dos Chatos

Antes de se aposentar da vida, sempre que eu e meus irmãos ficávamos enfezados com alguma coisa, meu pai logo acabava com nosso mau humor dizendo: "Puxa! Quando eu chegar na idade de vocês espero não ficar tão chato!!!"
O velho sabia das coisas. Estamos mesmo ficando chatos. Crianças, jovens e idosos... Os chatos estão se multiplicando em escala geométrica. E eu posso provar. Farejo longe o cheiro da chatice humana.
Certa vez, no supermercado, fazia as compras do mês, quando vi dois carrinhos que seguiam à direita da gôndola cruzarem-se com um terceiro, que se aproximava do lado oposto no mesmo corredor. O condutor do carrinho da frente, um senhor que aparentava pouco mais de 70 anos, logo esbravejou: "Minha senhora, carrinhos tem que ficar do lado direito e não do esquerdo!!! Pessoas à esquerda e carrinhos à direita!" Assustada, a senhora que havia infringido o "Código Nacional de Trânsito de Carrinhos de Compra em Supermercados Lotados" respondeu: "E onde pago a multa? No DETRAN?" Poucos minutos depois, senti de novo o mesmo cheiro. Mais chatice no ar... A troco de nada, um jovem rapaz gritou com um casal que estava à procura de um carrinho para entrar no mercado. "Vão fazer o que aqui dentro? Vocês não estão vendo que o lugar está lotado?" Antes de ouvir a resposta chata, deixei depressa o local e farejei mais uma cena. O sinal havia fechado. Dezenas de pessoas atravessavam a rua simultaneamente. Na primeira fila de carros havia um reboque levando três veículos para a oficina. Em seu interior, o motorista atento intercalava o olhar: ora sinal, ora pedestres. Um senhor de meia idade, que caminhava na faixa, parou, encarou o guincho e, no meio da multidão, gritou: "Tá faturando hein???" A reação do condutor foi engraçada. Levantou as mãos e soltou um divertido: "Eu hein!!!" Apressei o passo para chegar logo em casa. Passei em frente à lotérica e resolvi fazer a fezinha da semana. Dessa vez, uma mocinha, pouco mais de vinte anos, havia terminado de preencher sua cartela, entregando-a para o caixa junto com uma nota de R$ 50,00. Bem treinado, o rapaz conferiu o dinheiro e, rapidamente, entregou o troco para a cliente que reclamou bem alto: "Moço! Eu lhe dei uma nota novinha e você me volta essas notas velhas e sujas? Quero tudo novo em folha ou não sairei daqui hoje!" Confusão instalada. O gerente logo apareceu. Explicou que não possuía na loja notas novas, e que era um simples comerciante. "Apenas nos bancos a senhorita encontrará cédulas em melhores condições", argumentou. A moça bateu o pé. "Não saio. Não saio. Não saio."" O pessoal da fila começou a chiar. "Sai daí ôôô! Para de atrapalhar!" Depois de muito tumulto, ela finalmente se conformou e aceitou receber sua nota de volta, desistindo do jogo já feito. Não titubiei. Ao chegar minha vez, disse para o caixa que queria fazer o jogo da chata. Adivinhe? Ganhei. Não foi nenhuma megasena acumulada, mas deu prá passear no Rio e ainda bancar o churrasco da galera. Que chato, não?
(Nando Faro, correspondente especial do facebook)

domingo, 20 de fevereiro de 2011

Quem mexeu na trave ???

"A trave salvou o time do rebaixamento." Mas quem mexeu na trave? Quando ela se moveu? Eu não vi isso acontecer! Esses eram meus pensamentos quando criança, atribuindo o fato de não enxergar o movimento do objeto inanimado à minha miopia crônica. Com o passar dos anos percebi nessa e em outras metáforas um veio autoritário de nossa cultura. Será que estou vendo demais? Vejamos. Ainda dentro do universo futebolístico, quantas vezes você já ouviu que "a estrela do técnico brilhou" ao substituir um jogador que entra em campo e faz o gol da vitória? No campo da política não é diferente. Quantas vezes você já leu nos jornais que o "Palácio do Planalto quer" que a lei tal seja aprovada? Niemeyer deve orgulhar-se de ter projetado uma edificação dotada de desejos e personalidade. Também é comum ouvir na tv que "Brasília votou ontem" o novo valor do salário-mínimo. Que cidade inteligente, não? Daí para a editoria econômica é um pulo. E lá está a reportagem falando sobre o atual "vilão da inflação". Vez ou outra surge um novo criminoso que, ao ser apresentado à Nação, surpreendentemente não nos surpreende mais. Exemplo? Chuchu! Sim, o chuchu já foi um dia o inimigo público número um. Mas o pior de nossos pesadelos, que nos acompanha por toda a vida, é o famoso "Leão do Imposto de Renda". Fique esperto. Esse bicho ainda vai te pegar. Quando soube que o rei dos animais não andava solto por aí como pensava, amedrontando as pessoas sob o comando da Receita Federal, achei que estavam me enganando. Preferi esquecer apenas de Noel e manter a vigilância alerta. Sabe-se lá..! Poderia passar o dia lembrando de outras metáforas e associações que nos fazem "temer" em vez de "entender". Até em casa, em plena era da nanotecnologia, ainda ouvimos ameaças do tipo: "se você não comer a salada vai tomar injeção". Dois erros. Não se explica porque comer bem é importante e transforma-se algo que pode salvar vidas em um monstro terrível. Falo por experiência própria. Dia desses precisei coletar sangue para exame de rotina. Como a maioria das pessoas, virei o rosto para a parede e fixei o olhar no único quadro pendurado na pequena sala do laboratório. Era um desenho da bandeira nacional. ORDEM E PROGRESSO. Há quem diga que nosso lema oficial tem origem em outro lema considerado autoritário, de autoria do positivista francês Augusto Comte: "L'amour pour principe et l'ordre pour base; le progrès pour but."
Difícil acreditar...

O Aroma da Economia

2 + 2 = 4.
Certo? Só na Matemática...
Tenho sido bombardeado pela mídia e seus especialistas com análises econômicas que afirmam que cada real de aumento no salário mínimo significa acréscimo de 280 milhões de reais nas despesas do governo. 
Ponto.
O cidadão que não é formado em economia absorve a informação como verdade absoluta. Mas se existe mesmo alguma verdade absoluta no mundo é que em economia nada é absoluto!
Um real a mais no bolso do cidadão significa um real a mais em consumo. Um real a mais para comprar um produto ou serviço, onde parte desse real, recebido pela empresa que forneceu o produto ou serviço, é usada para pagar funcionários, custos administrativos e impostos... OPA! Espera aí...
- o que você disse, Faro? impostos?
- é isso mesmo...
- e para quem vai o dinheiro dos impostos?
- vai para os cofres públicos...
- o que vc está dizendo é que aquele real a mais dado ao salário mínimo e que poderia gerar 280 milhões de reais em despesas para os cofres públicos, uma hora retorna para os mesmos???
- sim...
- então a conta não é tão simples assim...
- não, não é...
- mas Faro, e se em vez de o cidadão consumir esse real a mais, ele decidir poupar para investir no futuro?
- veja, se ele resolver poupar, onde você acha que fará isso? debaixo do colchão? no cofre? no bolso do casaco? é óbvio que irá guardar em um banco...
- e o banco vai guardar o dinheiro dele?
- vai, mas não o deixará parado. o dinheiro captado (depositado) dos clientes (pessoas físicas e jurídicas, tais como empresas, indústrias e/ou governo) é utilizado pelos bancos para conceder empréstimos a outros clientes mediante cobrança de juros. é assim que os bancos ajudam o dinheiro a circular na economia.
- então os bancos ficam se aproveitando do dinheiro dos outros...
- em parte você está certo. porém os bancos são instituições essenciais à manutenção de atividades comerciais porque, além de oferecer serviços financeiros, facilitam transações de pagamento e oferecem crédito, ajudando no desenvolvimento do comércio nacional e internacional.
- ahhh! é assim que eles sobrevivem?
- sim, os bancos conseguem obter lucros por meio dos juros e das taxas cobradas pelas transações efetuadas. 
- então, caro Faro, com o empréstimo desse real pelo banco, alguém irá pegá-lo para consumir ou investir, certo? agora estou começando a entender e sentir um cheiro bom...
- é o aroma da economia, da circulação da riqueza. dois mais dois só resulta em quatro para inglês (e o resto do mundo) ver. e assim se forma a opinião pública equivocada... 
- entendi! mas e a inflação? aquele câncer que corrói o dinheiro do povo? você não está esquecendo o mais importante?
- talvez. com a história da inflação, voltamos ao inicio do texto, quando eu disse que na economia NADA é absoluto. a inflação deixa um cheiro horrível por onde passa. mas isso, meu amigo, será assunto para outro dia...
(Nando Faro, correspondente especial do facebook)