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terça-feira, 11 de janeiro de 2011

Historietas de Horlando - Cap.3

Sonhei que havia ganhado na megasena acumulada. Acordei com vontade de arriscar uns palpites, mas desisti na última hora. Não sou dado a jogos de azar. Das gincanas que participei na infância, não me recordo de conquistar sequer um pirulito. Dos bingos da mocidade, lembro do fiasco ao devolver as cartelas em branco. E foi assim até a fase adulta. Legítimo pé frio. Mas quando o assunto é blitz, sou sempre laureado. Da última vez, eu e Maria (a patroa) voltávamos da casa da minha cunhada na Tijuca quando fomos parados por duas viaturas da polícia. Gelei. A carteira estava vencida. “Documentos do carro e habilitação, por favor.” Entreguei os dois rezando por um milagre. “Dr., sua carteira de motorista perdeu a validade há mais de trinta dias. Não posso deixá-lo prosseguir”, informou a autoridade. Expliquei que estava trabalhando muito, que tentei agendar a prova no DETRAN por duas vezes, que estava a poucos quilômetros de casa, que morava na Tonelero, que o fato não voltaria a ocorrer, que sabia ter agido mal, que.., que.., que... Sensibilizado, o policial olhou para Maria e perguntou: “A Sra. dirige?” De pronto ela respondeu que sim e, abrindo sua bolsa, mostrou orgulhosa a habilitação. Maria tinha carteira, apesar de não pegar no volante há mais de 20 anos. Medo do trânsito carioca e pavor dos motoristas de ônibus. Confidenciou-me, certa vez, que os imaginava dinossauros correndo livres pela selva metropolitana, prontos para esmagá-la na primeira curva. Voltei novamente a atenção para o sermão que, agora, discorria acerca da gravidade e das conseqüências da falta cometida, citando artigos, incisos e alíneas do Código Nacional de Trânsito. Pausa para um muxoxo. Concluiu com o famoso "dessa vez passa", e disse que não me multaria desde que Maria tomasse a direção do veículo, conduzindo-o até chegar em casa. Congelei. “Maria??? Dirigindo até em casa??? Comigo no carro??? Nunca!!!”. A reação foi tão espontânea que não pensei no fato de melindrá-la. Era simplesmente uma questão de sobrevivência. Enervou-se. “Olha aqui, Dr., eu estou tentando quebrar seu galho. Ou Dona Maria dirige ou terei de rebocar o carro”. Dado o ultimato, resolvi apelar para o senso comum. “O Sr. está tentando ajudar... entendo... o que é coisa rara hoje em dia. O problema é que o Sr. não conhece minha mulher. Ela e o volante não combinam”. O policial olhou novamente Maria – cuja tromba já ultrapassava a janela do carro – e ameaçou impaciente. “O Dr. está me fazendo perder tempo. Resolva logo: vai deixar sua mulher conduzir o carro ou terei de apreendê-lo agora?”. Num lampejo, peguei meu caderninho de anotações e uma caneta e devolvi a ameaça. “Está bem, seu guarda. Maria guiará o veículo até nossa casa. Preciso só de uma gentileza sua. Assine este papel responsabilizando-se por qualquer acidente que venha a ocorrer com ou sem vítima fatal. Sou advogado e escreverei a declaração para que possa assiná-la, ok? Atônito, e vendo que falara a sério, liberou-me sob o olhar assassino de Maria. Ao chegar em casa, para meu azar companheiro, não trocamos palavra. Ela simplesmente arrumou o sofá da sala e obrigou-me a dormir sozinho por três longos sorteios da megasena...

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